E com vocês mais uma sucesso de audiência: o vampiro! Diante do expressivo número de fãs de nosso personagem, me pareceu razoável fazer um post que falasse exclusivamente dele. Mas a novidade não é tão nova. O tema, defende alguns, remota desde o Antigo Egito. Dos monstros, sem dúvida, é o mais popular: ao mesmo tempo que assusta, atrai, é sedutor. O vampiro não ataca a vítima, ela que se entrega às suas presas sedentas de sangue humano (Leia mais em: Conceito III: As sete teses). 'Se, por um lado, o vampiro é o horripilante que a ciência deve destruir, ou seja, a ameaça que nos atrai para a zona perigosa de umbral que é a morte-vida, por outro ele apresenta um lado mágico e mítico que fascina. Lado da sedução, da magia e do sonho: a vítima entrega o seu pescoço (sensual) ao morcego liberto', afirmam Aidar e Maciel.
Mas sem realizarmos um extenso estudo sobre o nosso temido e amado sangue-suga, falaremos apenas algumas das principais questões relativas ao nosso habitante das trevas. É inegável o imenso número de filmes (em certo sentido até constrangedor) que tratam do vampiro. Basta dá uma olhada nas prateleiras de uma locadora para ver as versões mais estranhas para a lenda. Do Drácula de Bram Stocker de Francis Coppola (1992), um dos mais bem elaborados na opinião desse pobre mortal, passando pelo estranho Entrevista com o Vampiro, em que vampiros metaforicamente encenam peças de teatro com humor negro, e chegando ao mais novo sucesso de bilheteria que a série iniciada com o Crepúsculo (2008).
Nobres ociosos e libertinos
Em um interessante ensaio, Aidar e Maciel registram que 'algumas bocas afirmam que os vampiros eram nobres ociosos que promoviam grandes orgias noturnas, atraindo donzelas da plebe. O alho poderia ter passado à história em função da estratégia das mães, que obrigavam as meninas a mastigarem-no para ficarem com mau hálito'.
Homossexualidade e Bissexualidade
Aparentemente sedutores de virgens e donzelas em perigo, os vampiros são representantes eminentemente da bissexualidade, pois se satisfazem tanto com sangue de homens como de mulheres. O ato de morder o pescoço da vítima, uma das zonas mais erótica do corpo, e de sugar o seu sangue, lembra (mas também serve de símbolo) do ato sexual. O crítico de cinema, Luiz Nazário afirma que 'o vampiro pode satisfazer-se tanto em homens quanto em mulheres, numa luxúria que contamina as vítimas. Sua verdadeira natureza é bissexual'.
O mesmo pesquisador ainda acrescenta uma padrão de similitude entre a condição vampiresca e a homossexualidade. Nazário argumenta que ambos os códigos é uma rebeldia contra os preceitos (preconceitos) de nossa sociedade. 'Tal como o morto-vivo, condenado a viver na sombra, o homossexual não pode mostrar seu desejo à luz do dia, privado da felicidade cotidiana, exclusiva dos casais heterossexuais. Tanto o vampiro quanto o homossexual representam uma ameaça fatal às instituições fundamentais da civilização: daí sua vinculação com a morte', escreve o pesquisador.
Aidar e Maciel também observam que o vampiro pode ser entendido com a representação dos excluídos do padrão de 'normalidade' estabelecida pela sociedade. Aqueles cujas formas de vida se diferenciavam dos demais eram, pois, considerados monstros. Eles seriam, escrevem, 'desgraçados no outro mundo, figuras errantes em busca de paz. Fantasmas andarilhos, presos entra a vida e a morte, cujo desespero os levava à busca da pacificação momentânea no sangue dos vivos. Sem dúvida, quem pagava o pato eram os suicidas, os malditos, os bruxos, os excomungados e sacrílegos; enfim, aqueles cujas singularidades não eram consideradas exemplares'.
Os educados vampiros atuais
Pelo que se observa, os vampiros atuais, jovens e apaixonados, ganham conotações mais humanizadoras. O forte teor erótico (homoerótico e de tendência bissexual) presentes nas representações anteriores, inclusive nos filmes citados, dão lugar ao ímpeto juvenil do rapaz que se apaixona por sua própria presa. Bonzinhos, educados e cheios de pudores, os novos vampiros não mais assustam. Agora eles querem ser como os humanos e sofrem demasiadamente por isso, como se o fato de ser homem preso aos padrões sociais do bom comportamento (eles vão à escola, fazem os deveres) fosse algo a se desejar. Particularmente prefiro os vampiros subversivos que contestam a ordem instituída. Eles vem nos perguntar por que consideramos normal as leis sociais. Ao invés de se apaixonar (obrigando-se a um relacionamento estável), o vampiro tradicional nos pergunta por que temos que casar, por que não ficamos com quem queremos (homem, mulher, os dois, os três). O vampiro clássico é a apoteose dos nossos instintos mais animalescos (o Id para os psicanalistas) e o atual é o jovem reprimido que vive sob a máscara da civilização que impõe o seu padrão de moda e comportamento social. Escondidos, os vampiros de Meyer é a representação do adolescente angustiado entre o pode ser e o que é obrigado a ser. Estranhamente, a autora propõe o bom comportamento como meta. Falta-nos vampiros mais revolucionários.
Para saber mais...
AIDAR, José Luiz; MACIEL, Márcia. O que é vampiro. São Paulo: Brasiliense, 1986.
NAZÁRIO, Luiz. Da natureza dos monstros. São Paulo: Arte & Ciência, 1998.
Imagem: Drácula de Bram Stocker de Fancis Coppola